Entrevista | PE. Antônio Pandolfi fala sobre a Semana Santa e a Páscoa em tempos de Pandemia

Este será mais um ano em que viveremos a Semana Santa e o tempo pascal em meio a uma pandemia. Quantas dúvidas e quanta angústia passam por nossas cabeças! Mas nada deve abalar a nossa fé!

Convidamos o padre Antonio Luiz Pazolini Pandolfi para conversar conosco sobre esse novo contexto em que vivemos. Afinal, nossa postura deve mudar? Como devemos nos adaptar a esse novo formato de vida pastoral e cristã?

Padre Antonio já foi Coordenador Diocesano de Liturgia e atualmente é pároco da Paróquia São João Batista, de Aracruz. Nesta entrevista, ele generosamente nos dá conselhos muito importantes que, se aplicados, farão toda a diferença para nós e para o mundo!

Em tempos de pandemia, a Semana Santa assume um significado diferenciado?

Pe. Antonio: Nossa Semana Santa será diferente: não haverá procissões, confissões, solenes celebrações e multidões participando presencialmente, mas não será uma páscoa menor! O Cristo estará presente no meio de nós, no coração de tantas pessoas que estarão ouvindo e acolhendo nossas preces em seus lares. Embora estejamos isolados fisicamente, estaremos próximos e unidos na fé e no amor (Jo 13,34-35).

Que sentido assume a “Igreja doméstica” neste tempo?

Pe. Antonio: Em meio a esta pandemia, houve a redescoberta da “Igreja doméstica”, este belo conceito de São Paulo VI. A família reaprendeu a estar junta, a rezar unida, a compartilhar a vida, a existência. Este tempo de pandemia também nos fez estar presentes nas casas e na vida das pessoas de uma forma nova: por meio das mídias sociais. Já as usávamos como meio de comunicação, de evangelização e de missão. Este tempo acelerou o processo de uso dessas mídias para reuniões, missas, celebrações, terços, orações, lives… tudo on-line. Descobrimos uma nova forma de nos fazermos presentes nas casas, nas famílias e na vida das pessoas. E as pessoas descobriram este novo modo de presença, de participação na comunidade. É um passo que foi dado e que não poderá retroceder. Porém, nossas celebrações, voltarão a ser presenciais. A Igreja, desde o Novo Testamento, reúne-se em assembleia litúrgica, a cada domingo, para celebrar a memória da morte e ressurreição do Senhor, a Eucaristia. A própria assembleia reunida é sinal da presença do ressuscitado (Mt 18,20).

Existe uma oposição entre a assembleia litúrgica presencial e a virtual?

Pe. Antonio: Não. Trata-se de uma forma de continuar atingindo tantas pessoas que ainda não se despertaram para a importância de viver e partilhar a fé em comunidade, e que, vendo a vivacidade da comunidade cristã, poderão ser atraídas para esta. Por isso, o uso das mídias sociais deverá continuar a ser um grande elemento da presença da Igreja, de evangelização, de missão, de oração com o nosso povo.

Como deve ser a postura do fiel ao longo desta Semana Santa? Como o senhor orienta que seja a oração de cada um?

Pe. Antonio: Embora as missas presenciais estejam mantidas, com número restrito de fiéis na Igreja, tenho incentivado os fiéis a acompanharem as transmissões através dos meios de comunicação da paróquia, favorecendo momentos de oração pessoal e preces a Deus em família, para que nos proteja e nos livre deste e de muitos males que atentam contra a vida na sociedade, pois a humanidade inteira, frente à pandemia do Coronavírus, vive uma espera angustiante, muitas vezes impaciente, carregada de incertezas, dúvidas e isolamento social. Envolve-nos a “noite” que afeta a todos de maneira igual.

E quanto aos fiéis que gostariam de estar presentes fisicamente, mas não podem?

Pe. Antonio: Tenho profunda preocupação com esses fiéis que, por conta do crítico momento atual, não podem participar plenamente desses momentos tão fortes de espiritualidade, e que encontram na Igreja o alento de que precisam para manter firme a sua fé. A oração é remédio que fortalece e ajuda a nós, cristãos, para que realizemos tudo o que é necessário para superar a ameaça desta enfermidade e de outras. Nosso compromisso é, acima de tudo, com a preservação da vida humana! Com consciência e muita responsabilidade, quero dar a minha contribuição para que possamos vencer essa pandemia que tanto mal tem causado à sociedade.

É tempo de remover as “pedras pesadas” da dor, do fracasso, do vazio e da morte, que muitas vezes batem em nosso coração e que impedem a entrada da luz, da vida e da alegria. Lembremos do que disse Jesus: “Não tenhais medo, eu venci o mundo”; “Eis que estarei convosco, até o fim dos tempos” (Mt 28,20). Deixemo-nos iluminar pela Luz da Ressurreição!

O que é celebrar a Páscoa? A Oitava da Páscoa?

Pe. Antonio: “Vós sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e Samaria, e até as extremidades da terra” (Atos 1,8). Cristo Ressuscitou! Com alegria, anunciamos a vitória da vida sobre a morte. Acendemos nossas velas com a luz do Círio Pascal e acompanhamos a história da salvação, desde os primeiros pais até o tempo dos Apóstolos, chegando ao início da história e centro de toda a nossa fé cristã: a Ressurreição do Senhor. Por isso, com o hino do Glória, os sinos que dobram, as sinetas que tocam, as luzes e o canto do Aleluia, anunciamos esta grande notícia da Páscoa de Cristo e proclamamos a nossa fé na Vida Eterna. Mergulhados no mistério redentor de Cristo, vamos compreendendo que o caminho da cruz não é caminho de fracasso e de morte, mas de amor, doação e de vida plena.

Qual é a grande mensagem da Páscoa?

Pe. Antonio: Se o ser humano não faz de sua vida um dom para os outros, se ele não investe a sua vida em favor da vida, acaba perdendo-se a si mesmo. Esta é a mensagem da páscoa: morrer fazendo com que outros vivam. Sejamos germinadores de vida no mundo, como o foi o próprio Cristo!

Como viver profundamente o Tempo Pascal?

Pe. Antonio: É preciso, vivermos com responsabilidade este momento, incentivando o nosso povo ao cuidado com a própria vida e com a vida do próximo. Não nos esqueçamos das famílias, dos pobres, dos enfermos, dos vulneráveis, dos inúmeros infectados pela Covid-19 e outras doenças, especialmente aqueles que não têm acesso às necessidades básicas de vida e a um sistema de saúde adequado. A Igreja e a sociedade devem estar preparadas para acolher as pessoas fragilizadas, como uma mãe misericordiosa conduzindo as pessoas ao encontro com Jesus Cristo e integrando-as na comunidade. É Páscoa quando servimos com alegria, com zelo e com o devido cuidado aos que estão crucificados: os pobres no corpo e na alma. Cristo está ali! Está também nos irmãos que dedicam o seu trabalho a cuidar dos que sofrem, para que sejam curados e voltem para suas casas. É páscoa quando acolhemos os que sofrem e oferecemos o manto de nossos cuidados, como fez o povo de Jerusalém acolhendo Jesus, com palmas nas mãos e estendendo mantos pelo caminho. É páscoa quando em nossas casas descobrimos a alegria de estar ao redor da mesa, reunidos e unidos, rezando e confraternizando, seguindo o exemplo de Cristo que celebrou a Ceia com seus discípulos. É páscoa quando usamos máscara, lavamos as mãos e higienizamos os espaços como sinal de cuidado da vida, semelhante ao Cristo que lavou os pés de seus amigos e que a todos amou. É páscoa quando as famílias e os profissionais de saúde entregam seu tempo, arriscam suas vidas, fazendo quase o impossível para atender os doentes, doando-se, como Cristo fez na última Ceia. É páscoa quando nossos irmãos trabalhadores e empregadores, na cidade e no campo, nos diversos setores de serviços essenciais à vida, se doam, são sensíveis e solidários com as pessoas que passam por dificuldades humanas e financeiras, como aqueles discípulos que permaneceram junto a Jesus até o fim. Também é páscoa quando cada um assume a sua responsabilidade diante da crise humanitária, semelhante a Jesus que tomou a pesada Cruz nos ombros, por amor a todos os que sofrem. É páscoa quando não conseguimos vencer a batalha, enfrentamos o cansaço, passamos por perdas e nos entregamos nas mãos de Deus, semelhantes a Cristo que entregou seu espírito ao Pai. Por fim, será páscoa quando sentimos a dor, a despedida e o luto de um ente querido, mas permanecemos unidos e firmes na esperança, acreditando que, como Cristo, também venceremos o sofrimento e a morte. A verdadeira Páscoa é a vida que ressurge naquele que encontra sentido em servir o irmão!

O que a pandemia tem a nos ensinar?

Pe. Antonio: “Fica conosco, Senhor, pois é tarde e a noite se aproxima” (Lc 24,29).

À luz da Páscoa somos movidos a reinventar continuamente a nossa vida. Por detrás da pandemia, está sendo oferecida a todos nós uma “mudança de rumo na humanidade”. Somos confrontados, mais uma vez, com a fragilidade de nossas vidas. Estamos sendo forçados a quebrar o ritmo estressante e apressado que levávamos; estamos encontrando formas novas de rezar, de celebrar, de trabalhar e de educar; estamos ficando mais sóbrios, contentando-nos com o necessário. É gratificante e comovente ver tantos homens e mulheres que são presenças de misericórdia e, à maneira de Jesus, consomem suas vidas em favor da vida; histórias silenciosas de tantas pessoas que com seu compromisso ajudaram os outros a viver; pessoas que entregaram suas vidas sem aparecer nas “redes sociais”. Famílias, médicos, enfermeiros, padres, tantos cristãos e colaboradores da vida, que são servidores do Senhor, porque servem à vida, ao cuidado dos filhos de Deus.

Qual o papel da nossa Igreja em meio à pandemia?

Pe. Antonio: Todos estamos sofrendo com esta pandemia, mas os que mais sofrem são os pobres: aumento do número das pessoas em situação de miséria, perda de emprego, vagas de emprego diminuindo… A solidariedade é fundamental neste contexto. É preciso somar esforços com todos os setores da vida da sociedade e assistir os pobres, física e espiritualmente, pois quem tem fome não pode esperar. Precisamos sempre levar em consideração o cuidado com a vida, pois a centralidade deve ser sempre a pessoa humana, não do lucro. A Igreja deve ser portadora da grande Esperança que nasce da fé. Cristo Morto e Ressuscitado é a grande razão da nossa esperança. Como nos pede o Papa Francisco: “não deixemos que nos roubem a esperança!”. O anúncio de Jesus Cristo tem que ser portador de Esperança. A ressurreição de Cristo nos diz que Ele não se encontra mais entre os mortos, e que, portanto, a força deste mundo mortal foi rompida. Este foi o grande anúncio daquele primeiro dia da semana: ressuscitou, não está mais aqui! (Mc 16,6). A ressurreição de Cristo nos dá a certeza de que a história é história de vida e de ressurreição. Ele está conosco, não estamos sozinhos.

Que conselho o senhor daria ao cristão neste momento?

Pe. Antonio: Nesse momento difícil da história, deixemos que a luz do Senhor e o fogo do Espírito Santo iluminem as nossas trevas, e que levemos essa luz aos que ainda estão na escuridão ou na dor da sexta-feira da Paixão, ou na dúvida diante do “túmulo vazio” da falta de fé e de esperança. Tenhamos a atitude de Maria e do Discípulo Amado: “Viram e acreditaram” (Jo 20,8). É Páscoa! “Alegremo-nos e Nele exultemos!” (Sl 117).