A conversa de Jesus com os discípulos de Emaús foi o primeiro Círculo Bíblico. Nele aparecem três pontos que devem estar sempre presentes na leitura e na interpretação que fazemos da Bíblia.
1. Reflexão sobre a Realidade : Jesus soube criar um ambiente de conversa e, com muito jeito, forçou os dois a falar sobre os problemas da vida que eles estavam sentindo. Na conversa apareceu toda a realidade: a tristeza, o desânimo, a frustração dos dois, a sua falsa esperança de um messias glorioso, a decisão do governo e dos sacerdotes de condenar Jesus, a cruz e a morte, a conversa com as mulheres que provocou espanto, a incapacidade dos dois em crer nos pequenos sinais de esperança (cf. Lc 24, 13-24).
2. Estudo da própria Bíblia : Jesus usou a Bíblia não tanto para interpretar e ensinar a Bíblia, mas muito mais para com ela interpretar os fatos da vida e animar os dois rapazes. Refletiu com eles, fez ver que estavam errados na sua maneira de explicar os fatos e mostrou, com a luz da Bíblia, que os fatos não estavam escapando da mão de Deus. Isso exigia dele um conhecimento profundo da Bíblia. Jesus conhecia a Bíblia. Junto com os dois, ele soube encontrar aqueles textos de Moisés e dos profetas que pudessem trazer alguma luz para a situação de tristeza e mudar as idéias erradas que eles tinham na cabeça. Jesus não teve medo de criticar interpretações erradas da Bíblia. Pois o texto bíblico tem um sentido certo que deve ser respeitado, para evitar que se manipule o texto em favor das próprias idéias, como os judeus faziam (cf.d Lc 24, 25-27).
3. Vivência comunitária da fé na Ressurreição: Jesus andou com eles, conversou, criou um ambiente de abertura e teve a paciência de escuta-los. Falando da vida e da Bíblia, agradou tanto, que o coração dos dois se esquentou, e eles chegaram a convida-lo para jantar. Ficou com eles, sentou à mesa, rezou com eles e fez a partilha do pão, como se tornou costume entre os cristãos que tinham tudo em comum. Jesus não só falou, mas colocou gestos bem concretos de amizade. Ora, tudo isso é o ambiente da comunidade, onde se procura viver como irmão. É aí que se faz a experiência da ressurreição, do Cristo vivo no meio de nós; a experiência de Javé, Deus libertador (cf. Lc 24, 28-32).
Quando estes três elementos estão presentes na interpretação da Bíblia, aí a Bíblia atinge o seu objetivo e acontece o milagre da mudança: os discípulos descobrem a força da palavra de Deus presente nos fatos, começam a praticá-la e tudo se transforma; os olhos se abrem, as pessoas mudam; a cruz, vista como sinal de morte e de desespero, torna-se sinal de vida e de esperança; o medo desaparece, a coragem reaparece; as pessoas se unem, se reencontram e começam a partilhar entre si a sua experiência de ressurreição; os poderes que oprimem e matam já não causam desânimo; os dois discípulos começam a reler a sua própria caminhada e descobrem que tudo começou quando Jesus falava com eles sobre a vida e sobre a Bíblia; a fé se afirma, a esperança se renova e o amor abre novos caminhos (cf. Lc 24, 33-35).